domingo, 2 de janeiro de 2011
Foundiougne
De Diofior a Foundiougne a distância não é muita em linha recta. No entanto como a estrada tem de contornar vários braços de rio a viagem torna-se longa. De facto tive que apanhar quatro transportes diferentes até chegar ao meu destino. Primeiro apanhei o autocarro até à estrada Dacar - Kaolack perto de Tatadem, depois um taxi 22 places (uma furgoneta adaptada ao transporte passageiros) até Fatick. Em Fatick apanhei uma scooter (até as scooters podem ser táxis e com a vantagem de não ser necessário esperar por mais passageiros para partir). Entre Fatick e Foundiougne dá para ter uma melhor percepção da imensidão do delta de Sine-Saloum. A estrada percorre um istmo entre braços de rio, planicies secas, pantanos cobertos de erva, mangais e bancos de lama. Ao fim de alguns quilómetros a estrada termina abruptamente num embarcadouro junto a meia dúzia de cabanas de pescadores cobertas de colmo. Foundiougne fica em frente do outro lado do rio Saloum que é necessário atravessar no ferry.
Enquanto esperava pelo ferry que não tardou demasiado deleitei-me a ver os pescadores reparando as suas redes de pesca, os caranguejos na lama, os peixes no rio e as garças que a poucos metros de mim pescavam a sua refeição.
Á minha espera do outro lado do rio estava o Pape Mody Sow que faz biscates e trabalha como percursionista. O Pape rapidamente explicou que tinha havido uma mudança de planos e que já não me hospedar na sua casa. A cerimónia de circuncisão dos primos dele estava a ser na casa da sua familia, e a casa estava cheia com os primos e os guardiães, no entanto convidou-me para ir lá jantar e ofereceu-se para procurar comigo um "campement" (hostel) onde ficar. A nossa primeira opção, o campement mais barato da vila estava cheio por isso acabei por ficar no Baobab sur Mer. Não foi uma má escolha, o espaço é agradavel, principalmente agardou-me a vista da esplanada junto ao rio/mar? debaixo do baobab que dá o nome ao establecimento.
Depois de pousar as minhas coisas e de darmos uma volta pela vila para ele me mostrar os principais pontos de interesse dirigimo-nos à casa dele onde a cerimónia da circuncisão decorria.
No espaço ao ar livre no exterior da casa existiam dois grupos de pessoas, distando cerca de 60 metros entre si, um formado principalmente por mulheres e crianças pequenas e outro exclusivamente por homens. Era neste grupo que estavam os rapazes que tinham sido circuncidados.
Vestiam roupas tradicionais brancas estavam acompanhados de outros rapazes novos que eram os seus irmãos, e riam alegremente sem parecer que estivessem a sentir qualquer dor. Perguntei a que horas tinham sido circuncidados, responderam-me que já tinham sido circuncidados à quase três semanas. Afinal a cerimónia da circuncisão demora mais do que aquilo que julgava.
Fiquei a saber que as vestes que eles usavam eram especialmente fabricadas de forma a que não fizessem fricção nem tocassem em nenhuma parte do pénis. Fiquei também a saber que os guardiães se vão revesando e que fazem companhia aos miudos que foram circuncisados dia e noite durante 1 mês.
Os miudos tem que ficar sentados sempre com as pernas afastadas, para não fazer fricção, o que atrasa a cicatrização e pode levar ao aparecimento de infecções, até a dormir tem que estar de pernas afastadas, se juntarem as pernas a dormir imediatamente vem alguém e as afasta (os guardiães fazem turnos para que haja sempre alguém acordado a vigiar os miudos).
Os guardiães são familiares e amigos da familia, mas nunca o pai, embora os miudos possam receber ocasionalmente a visita do pai. No entanto durante este mês os rapazes não podem falar com nenhum elemento da familia do sexo feminino. Passam o tempo a aprender cântigos que falam do que é ser um homem, quais as suas responsabilidades e o que tem que fazer com as mulheres.
Hoje em dia a circuncisão propriamente dita é feita por um médico ou enfermeiro e com aplicação de anestesia local. Além disso se houverem problemas compram pomada anti-séptica, o que é bem mais eficaz a evitar uma infecção grave que os remédios tradicionais usados antigamente.
Jantei com os guardiães e os rapazes (massa servida numa travessa e comida com as mãos) e depois disseram-me que a tradição é que quem visita uma cerimonia de circuncisão, deixar um presente para que os guardiães possam comprar comida para a vigilia. Deviam ter-me avisado antes de terem convidado, mas jantei e explicaram-me muitos aspectos da cerimónia, aprendi bastante, por isso não me custou tirar uma nota da carteira.
Ainda fiquei bastante a ouvir os cantigos e lengalengas conversar com os guardiães, que queriam saber como era a vida em Portugal, se havia emprego, se eu conhecia alguém que os pudesse contratar para a construção civil...
Já bastante tarde disse que ia para o hostel dormir. Quando cheguei ao campement conheci um grupo de três franceses bem humorados que me estavam a tentar convencer a ir à discoteca da vila onde havia uma festa nessa noite. Avisaram-me que era possivelmente a ultima oportunidade de ir a uma festa no Senegal antes de começar o Ramadão. Fiquei com pena de não ir mas estava mesmo muito cansado, por ser tarde, pela viagem que tinha feito, mas sobretudo pelo tempo todo que tive de esperar ao sol pelo autocarro/ taxi/ scooter/ barco, o sol deixa-me mole!
No dia seguinte quando acordei toda a gente que conhecia estava a dormir. Os franceses porque tinham ido para a discoteca, o Pape porque tinha ficado acordado toda a noite com os rapazes. Tomei o pequeno almoço com calma, na bela esplanada em frente ao rio, tudo com optimo aspecto, até o pacotinho de leite em pó para preparar. Dei um mergulho no rio em frente à esplanada onde tinha tomado o pequeno almoço e depois fui dar uma volta a pé.
Para voltar encontrei um senhor que me deu boleia na sua charrete puxada por uma mula.
Os franceses já tinham acordado e fiquei a saber que iam na mesma direcção que eu. Almoçamos juntos thiéboudieunne com diversos acompanhamentos incluindo um deliciosa molho de tamarindo e tivemos conversas muito interessantes. Depois do almoço percebemos que os tipos do Gâmbia que tinham combinado que nos davam boleia no autocarro deles já tinham partido sem nós.
Arranjámos um táxi e fomos juntos até Sokone, aí um dos franceses cujo nome não me lembro saiu para apanhar um transporte para Kaolack e eu, o Mourad e o Julien continuamos até Tabakouta.
Etiquetas:
Africa,
baobab,
campement,
circuncisão,
costumes,
Foundiougne,
hostel,
mangal,
música,
pescadores,
saloum,
senegal,
Serer,
sine,
thieboudienne
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário